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Juiz Marcelo Bretas: Rio de Janeiro é exemplo para outros estados da luta contra a corrupção

O juiz Marcelo Bretas, titular da 7ª Vara Federal Criminal e responsável pelos processos da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro, admitiu a dificuldade de se investigar autoridades, mas considera emblemático o combate à corrupção que se faz no Estado, em que o foco são as pessoas que exercem o poder no governo. Marcelo Bretas foi um dos conferencistas do seminário “Corrupção e seus Desdobramentos Sociojurídicos”, realizado nesta sexta-feira, dia 30, no Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e promovido pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj).

Marcelo Bretas fez um breve relato do início da Operação Lava Jato no Rio, a partir de um processo na 7ª Vara Federal Criminal sobre esquema de pagamento de propina a integrantes do governo estadual por uma construtora. Segundo disse, a corrupção é um fenômeno mundial, e o Brasil está dando um exemplo de como combater esse mal, tanto que comissões estrangeiras de membros do Judiciário têm mostrado interesse em conhecer o trabalho realizado no Poder Judiciário nacional. Citou a instituição da delação premiada e a colaboração recebida de autoridades de outros países e também do sistema bancário internacional como importantes instrumentos para a localização e transferência dos recursos desviados pelos corruptos. Isto, em razão dos sofisticados esquemas utilizados pelos doleiros para a transferência de dinheiro da corrupção. Ele estima que mais de US$ 3 bilhões tenham sido movimentados pela corrupção para fora do país.

“A corrupção mata, como disse o ministro Luís Roberto Barroso, do STF. Ao desviar recursos, o corrupto impede que o estado aplique o dinheiro do tributo pago pelo contribuinte no hospital ou em obras nas rodovias” – assinalou o juiz federal. O magistrado acrescentou que a fonte principal da corrupção está nas campanhas políticas financiadas pelas empresas. “É um relacionamento espúrio da política com as empresas” – disse.

Para Bretas, a sociedade tem acompanhado e apoiado o trabalho do Judiciário, tanto que nas últimas eleições reavaliou os políticos tradicionais e escolheu novos personagens para cargos executivos e legislativos do país. Na abrangência da pena imposta aos corruptos, ele defendeu a retomada dos valores desviados e a sua devolução aos cofres do estado. Marcelo Bretas disse que, assim, recuperou R$ 250 milhões, depositados na folha de pagamento dos aposentados. Com o leilão de bens adquiridos com o dinheiro desviado por envolvidos no esquema do ex-governador Sérgio Cabral, foram arrecadados valores da ordem de R$ 2 bilhões para ressarcimento ao estado. O juiz destacou a necessidade de mais parceria dos operadores de Direito na jornada contra a corrupção.

“É preciso ampliar esta cultura para ter um país mais igual, livre da corrupção. Só assim, as pessoas serão atendidas nos hospitais, haverá menos mortes de policiais e os bandidos sentirão medo” – finalizou Marcelo Bretas.

30 anos de Emerj

O seminário foi uma das iniciativas em comemoração aos 30 anos da Emerj. Ao comentar sobre o tema escolhido para o encontro, o diretor-geral da Escola da Magistratura, desembargador Ricardo Rodrigues Cardozo, disse que a sociedade tem exigido mudanças no sistema político.

“A corrupção tira do Estado a capacidade de investir. Causa desemprego e a marginalidade. Temos a oportunidade de mudanças no quadro atual. É um dever ético, moral e de dignidade. Há sempre esperança no caminhar da vida e acredito que este caminho existe e estamos nele” – disse o desembargador.

O presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, desembargador Milton Fernandes de Souza, disse que o país passa por um momento de ajustes de conduta moral e ético. Neste panorama, destacou o protagonismo do sistema judiciário nacional.

“Esse protagonismo se iniciou com os juízes. E essa conduta vai trazer benefícios a todos “ – afirmou o presidente.

O seminário contou também com as palestras do procurador da República, Eduardo El Hage, coordenador da Lava Jato no Rio; do professor Adán Carrizo Gonzáles-Castell, da Universidade de Salamanca; e da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa da Silva, autora do livro “Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado”.

Eduardo El Hage fez um histórico da investigação do Ministério Público federal para desvendar o esquema da Lava Jato no Rio de Janeiro, que levou à prisão o ex-governador Sérgio Cabral, seus secretários, o governador Luiz Fernando Pezão e doleiros envolvidos na lavagem dos recursos desviados dos cofres públicos. Segundo ele, 300 pessoas foram denunciadas e identificados 15 tipos de crime.

As investigações começaram a partir da denúncia por diretores de uma construtora de que Cabral recebia 5% de cada obra contratada pelo governo do Rio. Deflagrada a Operação Calicute, foi possível identificar o esquema de propinas e a transferência de dinheiro para o exterior, através de operações realizadas por doleiros. Inclusive, disse o procurador federal, que o uso do dinheiro público foi descoberto na compra de votos para a realização das Olímpiadas em 2016.

“A população tem mostrado a sua indignação. Os processos são longos, mas a sociedade tem acompanhado e exigido mudanças. O Estado do Rio de Janeiro é um exemplo para o país” – disse o procurador.

O professor Adán Carrizo afirmou que mais de dois terços dos países do mundo sofrem com a corrupção. Revelou que é uma situação também preocupante para os espanhóis e que vem aumentando.

Já a psiquiatra Ana Beatriz traçou um perfil do psicopata. Informou que, de acordo com estudos, nem todo corrupto é psicopata, mas todo psicopata é um corrupto. Ela disse que o psicopata tem compulsão pelo poder. Acrescentou que o psicopata tem um desvio de personalidade e está em todo meio da sociedade.

“A política é um ambiente propício que atrai o psicopata” – disse a psiquiatra.

Os 30 anos da escola também foram tema da Revista da Emerj, coordenada editorialmente pelo juiz Antonio Aurélio Abi-Ramia Duarte. Ele fez uma homenagem aos magistrados que colaboraram com a revista. Destacou a realização do seminário, pela atualidade do tema.

“Não podemos deixar um país com vícios e mazelas para os nossos filhos. Por isso, é importante ter aqui os integrantes da força tarefa da Lava jato. Queremos um país novo e ético” – revelou Abi Ramia-Ramia Duarte.

O segundo vice-presidente do TJRJ, desembargador Celso Ferreira Filho, disse que a luta contra a corrupção tem sido vitoriosa e importante na restituição dos valores éticos e políticos.

“A sociedade não está mais sem esperança. Basta abrir os jornais e ver a prisão de governadores do Rio. O Judiciário mostra-se proativo, mas não podemos fechar os olhos” – afirmou o desembargador.

Participaram também da mesa de abertura a primeira vice-presidente do TJRJ, desembargadora Elizabete Filizzola Assunção, e o desembargador José Muiños Piñeiro Filho. Na plateia estavam os ex-presidentes do TJRJ, desembargadores Leila Mariano e Sérgio Cavalieri, desembargadores, juízes, promotores, advogados e estudantes da Emerj.

Fonte: TJRJ, em 30.11.2018